agosto 23, 2010

Almas, praia e luar.

Aqui a noite nunca é escura. As ondas continuam quebrando no mar inquieto, enquanto meus pés passeiam pelos desenhos disformes do calçadão. Atordoado pelo calor infernal, que sempre faz perder o sono e a pele queimar pedindo algo com vida.

Na areia da praia, próximo às rochas, as chamas nas latas movem-se segundo mandam os ventos e as pessoas conversam junto à música que toca num celular sobre as pedras da extremidade da praia. O anoitecer padece sob a luz forte da lua, iluminando os corpos condenados que, agora, se despem, correm até a praia e mergulham, enquanto outros cantam e dançam bêbados em ritmo descompassado.

O garoto sentado na areia me perguntou algo sobre cerveja ou vodka, mas minha atenção fora roubada, por uma garota loira parcialmente despida, de olhos claros e cintura fina.

— Quem é? — apontei-a e perguntei sem tirar os olhos dela.

— Natalie. Mas está perdida.

— Perdida? — perguntei.

— Os pais se separaram não faz muito tempo. — ele tragou o cigarro que estava segurando e logo continuou. — Sabe como é, garota rica. Só está se rebelando enquanto não cai a ficha. — soltou a fumaça, e fitou-me com um sorriso singelo.

— Não cai a ficha de...? — indaguei, confuso.

Ele completou.

— De que isso aqui não é vida. — deitou-se e os cabelos loiros enrolados sujaram na areia. — Álcool, almofadas... latas pegando fogo numa segunda-feira à noite. Nenhuma dessas pessoas está aqui porque querem estar. Estão, pois pertencem a esse lugar. E ela certamente não pertence aqui.

—Talvez pertença. — e olhei-a pela segunda vez naquela noite. De pele branca à luz da lua, serena com seus cabelos loiros sobre os seios descobertos. Deitada, ela apontava o céu como quem desenhava estrelas.

Estranhamente, meus olhos flamejantes não cessaram em admirá-la, embora aquela noite tenha sido muito maior. Eu havia acabado de encontrar duas belas almas, que caminhariam e dançariam comigo até o fim dos meus dias.

agosto 18, 2010

Les yeux au ciel

E os olhos ao céu delatavam seu divagar. Sentado num banco, esperando, passava os dedos pelas nuvens que cobriam todo o teto do mundo. Não podia tocá-las, sem dúvidas, mas podia imaginar como seria senti-las. De repente, uma brisa suave passou por seu rosto, molhou sua mão, e lhe doeu, pois lembrava como o vento corria nos campos paranaenses.

Passou a admirar as poças de água nas calçadas de São Paulo, notou que caía uma garoa fina e estendeu a mão para senti-la. Terra da garoa era o que diziam e lhe atentava tanto, parecia tão belo pela televisão, e agora ele tinha toda a bagunça, toda a chuva e toda a solidão. As pessoas não andavam, corriam. Havia um grande barulho, que, aparentemente, somente incomodava a ele.

A boca pouco abriu e gostaria de gritar suas saudades, mas não tinha coragem de gritar contra aquele gigante, que estava acordado, mas apenas o torturava. Era a vida. Ele agarrou o peito, pela blusa, puxou-a, tentando livrar-se do sentimento de vazio. A mão à cabeça, desespero. Um piscar de olhos e...

— Saudade? — disse a garota, segurando o café que fora buscar.

— Insuportável. — respondeu, sem olhá-la nos olhos.

— Eu gostaria de te levar a um café. Conversar e comer chocolate.

— Eu adoraria, e talvez seria muito feliz ao seu lado, mas estou ocupado.

— Olha pra mim.

— Ocupado.

— Eu te amo.

— E por algum motivo eu continuo preferindo a dor.

...

agosto 03, 2010

MAKE ME WANNA DIE

Eu adoro quando eu corto minha boca em frente ao espelho e o sangue escorre pelos lábios. Adoro passear com os dedos pelo meu corpo, manchando-o com parte de mim e sentir que tudo mudou. Tudo mudou e estranho encarar isso. Olha a luz! Teus olhos nesse teto de um branco encardido e minhas costas gelando nesse piso molhado.

E não preciso citar as drogas. Deixa o texto pesado, redundante, e nem ao menos me orgulho. É importante citar quando olhos são fechados e vêm aquelas luzes coloridas à cabeça, girando, piscando. O gosto de tequila, de sangue, do seu corpo. Meu amor não se foi, foi você, mas não me deixa caminhar sozinho. Não deixa-me dormir sozinho. É tua voz. Teus olhos. Sorrisos. Promessas. Faz-me querer morrer.

Eu sinto frio, me curvo, mas gosto da punição. É assim que quero acabar meus dias. Nu e num banheiro sujo, esperando que me salvem sem qualquer motivo coerente, pois eu mesmo não quero me levantar e tomar um banho, colocar roupas e forjar sorrisos.

Qualquer que sejam suas músicas, não me anima. Não são beijos ou abraços. Tentativas. Ele tem minha alma e não faz sentido buscar por outro filme. Eu agarro a cortina e choro, porque meus gritos não me aliviam mais. É vazio por dentro e o desespero me sufoca. YOU-JUST-MAKE-ME-WANNA-DIE!

junho 22, 2010

Inverno

Encostou a ponta da caneta sobre o papel desgastado. Buscando inspirações no coração apertado, trabalhou a primeira letra do pensamento como se o tempo fosse benéfico à autoria.

Era desorientado e cheio de sonhos. Agora, todo desventurado.

Os que o conheciam sabiam da sua grande tendência à melancolia, mas ele não os enxergava, não mais enxergava nem a si próprio. Sentia-se pequeno e desinteressante, não importava quantos livros lesse ou quantas canções compusesse naquele piano surrado de sua avó.

Respirou. Olhou a cadeira ao seu lado, onde costumava existir um grande expectador, seu maior expectador. O detentor de suas canções não estava mais ali para vangloriar as grandes feitorias do dramático apaixonado. Cortou-lhe o coração pensar. Debruçou fraco sob a pilha de papéis e, com as mãos ao rosto suado, acabou-se em lágrimas desesperadas.

A mão batera na garrafa de vinho, que caiu no chão e manchou o tapete. Ainda ouvia a água cair do chuveiro e bater na cerâmica da banheira. Ainda se lembrava do corpo descoberto sob a cama de lençóis bagunçados. E os cabelos despenteados desesperavam por entender, e ansiava pela loucura cada vez que lhe batia a lucidez.

Os dedos passearam pelas teclas do piano, mais tarde. Pulmões cansados deram espaço à ira...

De olhos brancos, encontro tua pele sob meus braços

E dói como o sangue deixa tua boca ainda mais bela

Lava toda essa dor do meu coração antes que ele pare por você

Mantém seus dedos sobre os meus e não adormeça mais

Chora que me ama mais uma noite, e serei eternamente grato.