outubro 31, 2008

Bem-vindo seja aquele que sente

Chegou em passos mansos. Sono vibrante.
Ainda que de mente vazia, permanecia historiante. Vez por outra soavam-lhe vozezinhas demonstrando educação, e logo sumiam nas barreiras de concreto.
“Vai, vai. Vai!” — Ouviu-se a voz vacilante do velhote pelos corredores e, então, viu passar o destemido num passear acelerado.
A principio não notara estranheza alguma. Desvencilhou-se e, diante dele, a discrepância momentânea.
— Olá! — estendeu-lhe a mão, a pequena criatura. Tinha olhos amendoados, extremamente notáveis, e nada mais. Como poderia eu descrever com maior profundidade tais esferas tão preciosas. Elas certamente me queimariam a visão.
O recíproco gigante de cabelos ondulados mostrou-se desengonçado. Mesmo sem muito domínio, abraçou a mão do garoto com a sua outra. “Olá!” disse, retribuindo-lhe o cumprimento com um sorriso amarelo. Tentou ser simpático.
A criaturinha pôs-se de costas a ele e seguiu caminho. Sumiu ao virar a esquina do pátio inaudível.
O pensador seguiu ali, fitando o chão como quem tenta fugir dos arredores. “As crianças não são assim, não como ele. Não fazem o que ele fez, assim. Há magia naquele pequenino, há magia, e eu a quero para mim. Quero abraçá-la e sentir o que tem a me oferecer de admirável.”
O pensamento seguia corroendo-lhe o ego, e lá estava o rompedor de silêncio de volta. Como num baque, o chão do Admirador estremeceu. Era a realidade acarinhando-lhe o rosto. Um tapa na cara, como tão somente ela tem aptidão em servir.
A insanidade da criança, demente, lhe sorriu. Desfilou o corpinho por esta tomado, e ainda que seu olhar fosse fulminante podia senti-la, estava sorrindo, mostrando-lhe seu futuro. Seu doloroso futuro. Percorreu o caminho realizando obscenidades. Assustou-se ao notar o vínculo, o real interesse em ser verídico. Apavorou-o vê-lo daquela forma.
“Pena!” pensou o ancião desconcertado. “Outro injustiçado. Talvez não saiba, ainda. Ou, talvez, seja eu querendo saber demais.”
A essência que percorrera aquele ambiente anuviado, branco, não fora o sorriso da insanidade, nem o encantador ato da criança. Tampouco minhas palavras relatando essa metáfora horripilante. Está em você senti-la.